quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Suicídio ou o Canto das Sereias

De todas as teses materialistas talvez a defesa do suicídio seja a mais perigosa, quer porque tira valor à Vida, quer por abrir caminho à aceitação de outras práticas igualmente equivocadas quanto ao sentido e valor incomensurável da existência carnal. Toda a apologia do suicídio se reveste de imediatismo e sofrimento insuportável sem qualquer perspectiva de futuro, logo a primeira coisa que morre é a esperança. Séneca escreveu precisamente numa das suas cartas a Lucílio que se deixa de sofrer quando se perde a esperança, o que na óptica do estoicismo se liga com não desejar demais nem se permitir perturbar pelos acontecimentos externos. Múltiplos são os desafios à preservação da vida, estando cada vez mais difundidos entre os jovens jogos que desafiam a morte como as corridas de carros, motas ou porque não dizê-lo as touradas. Igualmente alguns programas de televisão, as noticias quotidianas no jornal e diversos filmes mostram cenas escabrosas, violentas e contrárias ao instinto de conservação, passando a mensagem implícita ou explicita de que só se vive uma vez, nada faz sentido e se deve gozar o quanto puder porque o dia menos pensado perdemos a vida em qualquer acto absurdo. Creio ser necessário e isso mesmo pretendo com este humilde ensaio dar valor e sentido à existência humana, afirmar e acreditar que positivamente a Vida tem valor e nós temos valor perante a Vida, que tudo vale a pena se for direcionado para o Bem e o progresso pessoal ou colectivo, que não pisamos esta terra apenas uma vez e que o hoje é a construção do amanhã, passo a passo numa longa jornada rumo à perfeição que em termos emocionais poderemos à falta de melhor definir como plenitude. Antes de prosseguir gostaria de deixar um apelo ao gentil leitor/leitora, por favor nunca desistam de ser felizes e fazer aqueles que vos rodeiam igualmente ditosos porque verdadeiramente é a única coisa que vale a pena e em que todos concordaremos, desejamos ser felizes. A Vida é mais do que a soma do ontem com o hoje, estes dois factores são apenas importantes por darem origem ao amanhã que é onde devemos colocar o nosso olhar. Nunca esqueçamos que tudo passa, o agradável e o não agradável, por essa razão não nos devemos exceder na alegria nem fixar demasiado na tristeza mas sempre analisar os acontecimentos na base da felicidade que podemos auferir no futuro. O judaísmo tem inúmeras histórias sobre a esperança, aliás o hino oficial Hatikva em hebraico designa exactamente este sentimento. Contudo e sem menosprezar em nada a religião anterior, foi o cristianismo que muniu a esperança judaica de certeza, revelando os mecanismos da vida no corpo e fora dele fazendo da Alma o centro de toda a acção inteligente. Crer é transitório, saber é para sempre como afirma Joanna de Ângelis a nobre mentora espiritual do médium baiano Divaldo Franco. Quem sabe ler, vê um cartaz pensa “não vou ler”, já leu. Com as crenças espirituais passa-se o mesmo. É por essa razão talvez que um estudo recente apontou como as pessoas sem qualquer tipo de Fé se suicidam mais do que aquelas que advogam qualquer tipo de crença religiosa. Diversos são os caminhos sinuosos do autocínio mas todos eles convergem para um ponto: falta de sentido. O Homem é um ser dotado de razão, logo tudo o que faz deve de ser racional e ter um objectivo. Quando este objectivo não existe ou não é identificado pelo ser, o ser humano cria mecanismos compensatórios nem sempre correctos e convenientes que lhe permitam usufruir de algum prazer e felicidade. Alguns exemplos de mecanismos de compensação incorrectos e por certo inconvenientes pelos efeitos que causam serão o consumo de tabaco, bebidas alcoólicas, carnes vermelhas ou estupefacientes alucinogénios e psicotrópicos. Só a perseguição de um objectivo dá sentido ao trabalho e só a recompensa incentiva a buscar fazer mais e melhor, contudo esse objectivo ou recempensa não tem de ser meramente material, a consciência humana ao desenvolver-se abre-se para uma realidade mais abrangente, nota que a interajuda é do interesse de todos, que a instrução é melhor que a punição, que plantar uma árvore, tratar da asa quebrada de um pássaro ou acarinhar alguém em necessidade são actos com um sentido mais profundo do que o mero objectivo económico-financeiro. Por vezes oiço algumas pessoas queixarem-se da vida stressante que levam. Falam dos seus dias agitados, de como todas as suas horas são de luta para conseguir dinheiro sobre dinheiro ou reconhecimento em qualquer área, criando os mais diversos conflitos psicológicos quando não são bem sucedidas ou ironicamente se o forem alegando que agora que obtiveram o que almejavam já não há razão para viver, corroborando o que tenho vindo a afirmar, o ser humano necessita de objectivos para dar sentido à existência mas necessita igualmente de ser bem sucedido para se sentir pleno, para tal é conveniente interiorizar que tudo na Natureza é gradual e faseado não saltando a lagarta logo para o estado de borboleta sem passar pelo estádio de casulo. O suícidio é então um acto de revolta contra a Vida e em última instância contra o Senhor da Vida por esta não ter sentido nem perspectiva de felicidade, meta última que todos anelamos atingir. Se o sofrimento tomar proporções que a criatura não conseguir aguentar e cada caso é um caso, generalizar é errar à primeira e medir os outros pela nossa própria medida é falhar desde o início. Não temos todos a mesma resistência à dor e depois é muito fácil falar do sofrimento alheio, apenas um sentido de compaixão pode-nos permitir colocar-nos no lugar do outro e compreender o seu pesar. Também devemos colocar em pauta condições médicas como parafilias psiquiátricas ou psicológicas com todo um rol virtualmente interminável de neuroses e psicoses que em boa verdade não definem nada mas nos permitem manter algum controlo ainda que aparente sobre a situação quando não se penetra na raiz do problema encontrando a sua causa primária. A resposta para todas essas enfermidades é apenas uma: AMOR. Não o amor vulgar, cheio de pieguismo e facilitismo porque se ama. Quem ama compreende e apoia mas também dá espaço e ensejo para que o paciente se levante e ande como tantas vezes se vê no Evangelho de Jesus. É bom denotar que nem mesmo o mestre quando pisou a Terra em forma humana e conviveu connosco prometeu resolver os problemas pessoais de quem quer que fosse, ajudava sempre, não repudiava ninguém nem alegava cansaço para se furtar ao trabalho mas de todas as curas exigia que o paciente não mais reincidisse no erro tomando nas suas mãos a renovação que lhe permitiria libertar-se da dor e do sofrimento. Bem sei que todos nós já sofremos um pouco ao longo da nossa longa ou curta existência, no entanto é a perceção que cada um tem do problema que o torna mais ou menos suportável, levando a um desejo mórbido de evasão quando surge inultrapassável não se vislumbrando saída nem solução que por certo despoletarão no ser profundo o impulso do suicídio como mecanismo de fuga e defesa, cabendo ao ser consciente repudiar essa sugestão do inconsciente não só como errada mas falacioso por não aportar nenhuma solução para a questão antes complicando-a, no entanto nada disto é ou pode ser aceite pelo materialismo apenas reconhecendo a vida orgânica acredita que esta se extingue após a morte cerebral, indicativo de óbito reconhecido unanimemente como certo por toda a comunidade médica. O espiritismo no entanto abre novo campo de ideias reconhecendo que essa pessoa já existia antes de encarnar, isto é, apresentar-se com corpo físico e continuará a existir após deixar o invólucro carnal, não podendo eximir-se das suas responsabilidades colocando termo à vida. Este é um dos primeiros pontos que gostaria de deixar bem claro, ninguém morre! Isso mesmo afirmam praticamente todas as religiões, embora possam discutir o destino da alma após o abandono do corpo somático, todas elas aceitam a sobrevivência da mesma nalguma parte do universo. E o que é mais curioso, de uma forma generalizada as pessoas demonstram ter algumas ideias inatas ou pelo menos vontade de acreditar que existe vida após a morte. É por essa razão que entendo a fuga pelo suícidio como falaciosa ao gorar todas as esperanças de libertação, aumentando o sofrimento de quem lhe cai na rede reduzindo ainda mais a perspectiva de libertação da dor. Tal como o mítico canto das sereias na Odisseia de Homero promete o fim do sofrimento e gozo para a alma apenas para aprisionar quem se deixa enredar pela sua melodia enganadora.